Educação para o consumo consciente – Dinheiro e compras

Especialistas garantem: educação financeira deve começar nos primeiros anos da vida. Em Americana (SP), uma escola já põe esse ensinamento na prática.

Depois da separação no ano passado, a decoradora Marcela Argento precisou enfrentar, com os filhos, uma revolução na vida financeira. O orçamento foi reduzido a um terço. “Mudou bastante coisa. Eu tinha um plano (de saúde) muito bom, em São Paulo. Hoje tenho que contar com a rede pública. Passeios em shoppings, nos fins de semana. A escola dos dois era particular. Na hora em que nós viemos para cá, o mais velho foi para escola pública e agora consegui colocá-lo na escola particular, com bolsa. O mais novo ainda não vai. Não tenho condições”, desabafa Marcela.

Pedro, o filho de 7 anos, foi quem mais sentiu a mudança: “Ele queria a vida que tinha antes. Não queria a vida que estava agora. É muito difícil você ouvir isto de um filho. Porque ele tinha brinquedos, tinha os colegas e, de repente, tudo foi tirado dele”, lembra. Mas agora todos já estão se adaptando. A arquiteta, que nunca havia exercido a profissão, entra no mercado de trabalho cheia de novos projetos. Aos poucos, ela está conseguindo reforçar outros valores nos filhos.

Os nossos filhos começam a desejar já nos primeiros meses de vida. É justamente neste momento que, segundo os especialistas, a gente deve começar a trabalhar a educação econômica deles. Mas, independentemente da idade, os conceitos e os valores devem ser transmitidos e reforçados no dia a dia, para que eles sejam mesmo incorporados.

Não é uma tarefa fácil. Exige disciplina e muita determinação. É um processo de aprendizado que precisa envolver as crianças. Na infância, para compreender o significado de lucro e prejuízo e entender a importância de economia, só experimentando.

Os alunos do quinto ano de uma escola de Americana, no interior de São Paulo, receberam um desafio: economizar dinheiro o ano inteiro. “No final do ano, a gente vai ter um acampamento e é muito caro. Alguns pais não conseguem pagar”, diz Henrique Sai, de 10 anos. O desejo de todos é único: o acampamento em um parque ecológico. “É bem legal, porque a gente está vendendo uma coisa para conseguir o que a gente quer, que é ir ao acampamento”, comenta Júlia Rodrigues, de 10 anos. Os alunos precisam de R$ 4,2 mil e já têm R$ 2,2 mil.

Na aula, eles fazem reajustes no preço, definem a margem de lucro. “A gente está tendo bastante lucro, porque aumentou a venda”, explica uma menina. “Podia diminuir o preço, porque as pessoas iam comprar mais”, comenta Felipe N., de 10 anos. E os alunos até abriram uma conta no banco para eles. “No início, vendíamos apenas pipoca e bidu. E era um valor baixo: R$ 0,50. Demorava um pouco para dar lucro. Então, a gente combinou de vender o cachorro-quente que dá um lucro maior”, conta a professora Ariádila Andrade.

Fora a preparação do lanche, que é feita por funcionários da escola, os alunos cuidam de tudo. Arrumam as mesas, montam o caixa, os pontos de venda, atendem os consumidores. A venda é feita uma vez por semana e faz sucesso entre os outros alunos. No fim do dia, depois de contarem o dinheiro, precisam prestar contas dos ingredientes comprados pela escola. “Às vezes, eles brigam, porque eles não querem me pagar. Eles querem que o colégio assuma essa dívida”, diz a secretária financeira Regina Célia Mendes. “Quando a gente recebia o dinheiro, a gente ficava com mais. Vinha a diretora com uma conta enorme, a gente pagava e perguntava: tem que pagar mesmo?”, conta Maria Júlia, de 10 anos.

A proposta foi apresentada ao colégio pela professora Maria Belintane Fermiano, da Unicamp. Por cinco anos, ela acompanhou alunos de 8 a 14 anos. “Nossas crianças têm um perfil muito diferente do perfil de quando éramos crianças, porque não lidávamos tanto ou quase nada com o dinheiro. Eles, não. Eles já são clientes. Eles já têm um mercado voltado para eles. Eles precisam aprender”, afirma Maria Belintane Fermiano.

O primeiro passo, segundo ela, é a reflexão dos pais. Como distinguir desejos de consumo de necessidades reais? Quando eles reconhecem as diferenças, conseguem orientar os filhos. Fazer uma espécie de livro caixa com eles, anotando entrada e saída do dinheiro, ajuda a visualizar melhor os gastos. “A escola vem auxiliar, abrindo possibilidades dessa educação econômica acontecer efetivamente”, afirma a professora Maria Belintane Fermiano, da Unicamp.

A decoradora Marcela Argento garante: o apoio da escola faz toda a diferença. “Antes, eu comprava e depois fazia a conta. Hoje, eu faço conta para comprar”, afirma.


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